quarta-feira, 12 de setembro de 2007

O olhar estrangeiro de um poeta baiano*




(Foto crédito - Dimitri Vicenzi).


Quando decidiu trocar Salvador pela Europa, em 1990, Natan Barreto, que morou até os 19 anos no subúrbio de Periperi, não imaginava que essa experiência fosse transformá-lo num escritor apaixonado pela poesia. Atualmente, residente em Londres, ele retorna à capital baiana para lançar "Esconderijos em Papéis", seu segundo livro de poesias. A publicação, que ganha lançamento no dia 18 de setembro, às 19 horas, na livraria Saraiva, no Shopping Salvador, reúne 63 poesias, escritas ao longo de seis anos com o cuidado de um artesão. "Acho que o meu olhar de estrangeiro, de quem teve que aprender outros idiomas e ver o mundo novo e o mundo que havia deixado para trás com outros olhos, me fez o poeta que sou", conta ele.

Os versos de Natan nasceram e se consolidaram a partir do silêncio. Isso tem uma ligação direta com a outra atividade artística do baiano: a interpretação. Após graduar-se em teatro pela Uni-Rio, ele foi morar em Paris. Para ganhar algum dinheiro por lá, posava como modelo para pintores e desenhistas da Escola de Belas-Artes, especialistas em nu artístico. "Foi um tempo de silêncio. Passava até três horas imóvel e sem roupa. Nisso comecei a pensar frases, que ainda não eram versos, mas que já começavam a ser mais do que prosa", recorda.

Quando pisou em Paris, ele queria lapidar o francês que havia começado a estudar na Aliança Francesa, no Rio de Janeiro, cidade onde morou por quatro anos. Buscava outras formas de se sustentar, pois não queria atuar, devido a um recente medo do palco. No entanto, acabou co-escrevendo o roteiro e atuando em dois curtas-metragens, em Paris. Além disso, trabalhando como modelo, ele não conseguiria fugir totalmente da interpretação, já que dependia da expressão para ser retratado.

"Acho que se houve uma transição entre o ator e o poeta, foi naquele período", comenta. Ali começava a nascer o poeta, que registrava no papel essa experiência de ser estrangeiro, além da necessidade latente de se esconder. Daí o nome do livro "Esconderijos em Papéis". "Na poesia que dá título ao livro, falo do ato de se esconder por trás do papel do ator e no papel escrito. Até que ponto você pode realmente se esconder? No palco, a exposição por trás do papel de um personagem me incomodava. No papel poético, me exponho também, mas no momento que alguém lê meus poemas, eu já não estou ali, estou invisível, muito mais escondido do que no palco", diz.

Em algumas poesias do novo livro, editado pela Editora Kalango, aparece ainda um tema que se impôs a Natan de uma maneira muito forte em um curto espaço de tempo, a morte. Recentemente, ele perdeu uma tia, a mãe, e por último, o pai. Afetos e amores que o traziam a Salvador a cada ano.

Em homenagem à mãe, ele também fará o lançamento do livro na Escola Modelo Eunice Palma, que pertencia a ela. Já no dia 25, retorna a Londres, onde haverá mais um lançamento da publicação.

Na capital britânica, Natan atua como tradutor e intérprete. Além disso, coordena, desde 2000, o projeto "Encontros Poéticos", voltado para a divulgação da poesia e de poetas de língua portuguesa, tendo se apresentado na Embaixada do Brasil em Londres, em festivais literários, museus e universidades inglesas. Entre seus autores preferidos estão nomes como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Mello Neto e Vinicius de Moraes, além do poeta francês Arthur Rimbaud e do americano T. S. Eliot.

Apesar de ser radicado em Londres, 99% das poesias de Natan são escritas em português. Ele julga que em inglês sua expressão poética não tem a mesma força da língua-mãe. Dentre as poucas poesias escritas no idioma britânico, ele destaca duas: “Ruínas” e “A casa em chamas”. Foram inspiradas em fotografias do brasileiro Sebastião Salgado para ilustrar a exposição "Migrações", feita pelo fotógrafo em Londres, no ano de 2003. Foram convidados 15 poetas ingleses e um único poeta brasileiro, Natan. Na exposição, o texto acompanhava a foto, mas também podia ser ouvido na voz gravada do autor. "No entanto, acredito que a minha poesia verdadeira seja a que escrevo em português", salienta.

Sobre o autor - Natan Barreto nasceu em 1966, em Salvador. Graduou-se em Interpretação Teatral pela Uni-Rio. Além de Londres, onde reside desde 1992, morou também em Paris e Roma. Seu primeiro livro de poesias, "Sob os Telhados da Noite", foi lançado em 1999. Há dois meses, ele finalizou seu primeiro romance, que, aliás, levou dez anos para ser escrito devido à rigidez em busca da qualidade. O autor chama isso de um trabalho solitário.

"Fico horas olhando cada verso, cada palavra, cada vírgula. Reescrevo muito meus textos. Tem alguém que disse que se você quer ser relido, então, reescreva", frisa. Os originais já estão em uma editora londrina, mas o autor adianta que, muito provavelmente, este deverá ser o único da carreira no gênero, pois se vê mesmo escrevendo poesias, além de querer retomar a produção de roteiros. As poesias de Natan Barreto também farão parte de uma publicação, que será editada, até o final deste ano, pela Universidade Federal de Minas Gerais. A coletânea contará com a participação de autores brasileiros que vivem em países estrangeiros. A edição será bilíngüe e lançada no Brasil e nos países nos quais moram os escritores.
*POR MÁRCIA FERREIRA LUZ


Serviço: Esconderijos em Papéis (poesias)Editora Kalango
Autor - Natan Barreto
Lançamento - 18 de setembro de 2007, às 19 horas
Local - Livraria Saraiva / Shopping Salvador (3363-4308)
Preço sugerido - R$ 20
Mais informações: Márcia Ferreira Luz - jornalista(71) 8834-0857


Esta semana estarão postados aqui três poemas do autor.





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