Seu namorado, possuidor de certo conhecimento, desse de teses, dogmas e similares, reclamava freqüentemente de sua incapacidade de falar coisas proveitosas, das artes, das questões filosóficas e de outras aflições do tipo, enquanto ela pensava na palavra mais bela que um dia escutou. E distraía-se olhando para o nada; suas pupilas fixas e imóveis, enquanto ele falava e falava e falava. Depois, ela abria as pernas. Fazendo-o esquecer dos falsos tormentos. Dizia sacanagens, em seu linguajar coloquial-quase-chulo (não gostava de labirintos e filosofias, mas o amava e tinha medo de perdê-lo).
Em sua mente, só a tal palavra. Tão linda e forte, uma palavra robusta, valorosa: dita por ela, uma merdinha insignificante, frouxa e dispensável. E lembrava dela, da palavra. E da vida, de seu sincero sentimento, chorando de dor e felicidade, enquanto com agulha e linha (os olhos em lágrimas, as perfurações em seus lábios), costurava a própria boca, para poder amar seu homem em silêncio.
GUSTAVO RIOS nasceu em 1974. É baiano e mora em Salvador. É autor do livro de contos O amor é uma coisa feia, lançado pela editora 7 letras. Escreve regularmente nos blogs www.cozinhadocao.blogspot.com e http://feioamor.zip.net.
3 comentários:
Muito bom.
O livro de Gustavo é muito bom. Parabéns ao Entre aspas por ter feito esta escolha.
Abraços,
Renata
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