sexta-feira, 23 de novembro de 2007

POUCAS E BOAS COM....

NELSON MAGALHÃES FILHO


1-Bem, apesar de escrever você é artista plástico. Como é dedicar-se a estas duas artes?

Artes Plásticas foi o curso em que me formei na Escola de Belas Artes da UFBA, em 1883, pois sempre gostei de desenhar desde menino. Escrever foi uma coisa que veio do hábito da leitura. Minha tia possuía uma coleção “O Mundo da Criança”, e eu ficava assombrado com aquelas ilustrações e histórias extraordinárias. Como eu passava muito tempo sozinho, sentia necessidade de ficar reinventando minha vida besta numa cidade do interior, matando lagartixas e pulando os muros dos quintais alheios. Então, não me sinto um escritor, gosto apenas de me divertir com algumas bobagens. Até hoje não levo isso a sério, mas tenho muita paixão pelo que faço.


2-Leitura para você é hábito ou necessidade? O que gosta de ler? Há um livro que você considera indispensável?


Admito que não leio tanto quanto deveria, porque para se escrever bem é realmente necessário se ler bastante. Quando tinha 17 anos li “O Ovo Apunhalado” do Caio Fernando Abreu, e nunca mais fui o mesmo. Todos os bons livros são indispensáveis. Atualmente gosto muito do escritor colombiano Efraim Medina Reyes.


3-Artes plásticas. Como vai o panorama das artes plásticas na Bahia? Há tendências para uma vanguarda? Há diálogo entre os artistas no sentido de uma comunidade artística?

A Bahia hoje tem inúmeros artistas plásticos de talento construindo uma arte da maior expressividade, e que não deve nada a nenhum grande centro urbano do mundo contemporâneo. A associação de Artistas Plásticos Modernos está se reestruturando e, acredito num futuro promissor neste sentido. A gente precisa continuar lutando por mais espaços.


4-Um nome indispensável para o gênero na Bahia?

São vários: Sante Scaldaferri, Graça Ramos, Leonel Matos, Caetano Dias...



5-Agora dentro da literatura, a poesia é escolha ou é sina? Quais os nomes que você considera sinal de Bahia em literatura hoje?

Não acredito nessa coisa de sina. Há muitos escritores e poetas que eu gosto demais. Não daria para citá-los aqui pois poderia esquecer algum nome, e ai... Mas você pode dar uma olhada nos links do meu blog anjo baldio.


6-Da sua série de pinturas Anjos Baldios , que inclusive intitula seu blog, qual a proposta?Dentro do cromatismo o que se procura suscitar? Quais as referências dentro desta realização? Ou não há referências?

Nos últimos 20 anos venho investigando diversas técnicas através de espontâneas apropriações da arte infantil e dos esquizofrênicos, para elaborar pinturas dentro de uma poética “perversa” abordando aspectos de nossas vivências dentro deste violento mundo cotidiano. Então, eu procuro realizar essa abordagem sobre a desconstrução do imaginário infantil e dos marginalizados. Essas pinturas são interpretações pessoais desses estados acumulativos, construídos em camadas fragmentárias. Existe uma nova tendência da pintura que abusa do transbordamento em seu discurso estético que eu gosto muito. Posso citar como minhas principais influências o neo-expressionismo alemão, o movimento C.O.B.R.A, Iberê Camargo, Sante Scaldaferri, Donald Baechler. Francis Bacon, Egon Schielle, Pollock, Basquiat, etc.



7-Projetos?

Estou iniciando uma nova série de desenhos e pinturas para realizar uma nova exposição em 2008. Também estou trabalhando em alguns vídeos experimentais. E tomando aulas de guitarra para compor meus blues, já que toco muito mal.



8-Você ensinou por um tempo pela docência na escola de Belas Artes da UFBA. Como é ensinar algo tão complexo como a arte? Como foi sua experiência neste período?

Fui Professor-Substituto de Pintura II (2004-2006) e não achei tão difícil ensinar a pintar a figura humana, pois tive professores fantásticos como Ailton Lima, Juarez Paraíso, Graça Ramos, Márcia Magno, etc. Foi uma experiência inesquecível e tive alunos maravilhosos.



9-Dentro do meio artístico baiano como transita Nelson Magalhães Filho?

Estou sempre realizando meus sonhos. Fiz diversas exposições individuais e coletivas em vários estados, publiquei alguns poemas em alguns jornais e revistas literárias. Fui premiado várias vezes nas Bienais do Recôncavo do Centro Cultural Dannemann e nos Salões Regionais de Artes Plásticas da Funceb. Em 1999 fui contemplado com o Prêmio Copene de Cultura e Arte (atual Braskem). Também participei com um vídeo na última Jornada Internacional de Cinema da Bahia, dentro do Programa Nova Produção do Cinema Bahiano. Mas o importante talvez seja a crítica corrosiva do público.


10-Por fim, um livro, um filme, um disco e uma frase pra por na capanga e sartá no caminho. Viagem rumo incerto sempre?

Seria impossível responder a tudo isto, porque a arte como a vida é sempre imperfeita e está em permanente mutação. Poderia citar alguns autores que eu admiro como Rilke, Hilda Hilst, Rimbaud, Cortázar, Clarice Lispector, Henry Miller...

Adoro os filmes do David Lynch, Herzog, Glauber, Wim Wenders, Almodóvar...

Ouço o tempo inteiro Bob Dylan, Lou Reed, Tom Waits, Marianne Faithfull, Leonard Cohen, Nick Cave, Nico, Patti Smith, Chavela Vargas, P.J. Harvey... também Caetano Veloso, Lenine, Cazuza, Raul Seixas, Xangai, Elomar, Chico Buarque...

Agora a frase: tem uma do Rimbaud que acho demais: “A moral é a fraqueza do cérebro”.

Nelson Magalhães Filho é artista plástico e mantem o blog www.anjobaldio.blogspot.com

8 comentários:

sandro so disse...

Fechar com essa do Rimbaud foi perfeito, e coerente, Nelson.
Valeu pela entrevista!

Ruela disse...

Grande Nelson.
Um abraço.

Anônimo disse...

Muito boa a entrevista! Tanto pelo entrevistador, que permitiu a quem não conhece o Nelson ter uma idéia mínima de seu percurso, quanto do entrevistado, que situou suas referências e permitiu entrever suas inquietações artísticas... Mas confesso que fiquei com a sensação de querer saber um pouco mais da poética "perversa"... do trabalho de apropriação do universo infantil e esquizofrênico, como eles aparecem no seu trabalho... Grande abraço!!!

Anônimo disse...

sujeitos viscerais (por excelência, não por pose) são sempre bem-vindos pressas bandas
saudações, man

Kátia Borges disse...

Excelente entrevista, grande artista. Adorei!

Senhorita B. disse...

Grande entrevista, Nelson!
Abraços,
Renata

anjobaldio disse...

Caros amigos: obrigado pelos comentários. Ainda acho complicado falar de meus trabalhos... Mas os desenhos são "perversões" do traço infantil e da arte dos "marginalizados", com uma "roupagem" mais urbana e contemporânea. E o mundo anda tão violento. Abraços.

Anônimo disse...

Ótima entrevista, Nelson! Literatura, pintura, cinema... e a verve de Rimbaud. Não faltou nada.