sábado, 17 de novembro de 2007

TRECHO DO ROMANCE UM RIO CORRE NA LUA,

DE RUY ESPINHEIRA FILHO


O prefeito soube pelo seu chefe de gabinete.

– Visagem? – perguntou o Dr. Fulgêncio.

– Sim, doutor.

– E em pleno dia? Ora, bobagem tem limite!

– Se é bobagem, é das grandes, doutor: me disseram que há um mundo de gente enchendo a Rua da Areia!

– É, tudo pode acontecer mesmo nesta vida, até visagem em pleno sol!

Bom, ele iria verificar. Fechou o volume que estava lendo, do seu colega de Medicina Anton Tchekov, e saiu. A Delegacia ficava no caminho, ele entrou. O tenente Evandival folheava uma revista velha e não sabia de nada.

– Uma visagem, doutor?!

– Foi o que o atrapalhado do Alcides me disse.

– Essa gente acredita em qualquer coisa.

– O homem só evolui na tecnologia, tenente. No resto, é o mesmo dos tempos de Adão.

– É, doutor... Vai ver, é algum palhaço de perna-de-pau anunciando circo.

– Espero que sim, estamos mesmo precisando de divertimento por aqui. Mas não duvido de que possa ser mesmo uma visagem.

– E o senhor acredita nessas coisas, doutor?!

– Não é questão de eu acreditar ou não, mas de se acreditar. Havendo quem acredite, sempre haverá... Talvez a única atitude sábia seja nunca duvidar de nada na vida, tenente. Porque ela é feita de alucinações sem fim, talvez até um pouco mais em Rio da Lua.

– Será mesmo, doutor?

– Não duvide, tenente.

3 comentários:

Anônimo disse...

Ah, esse trecho é muito convidativo... Parabéns, Ruy.

anjobaldio disse...

O Ruy é um dos nossos maiores poetas. Abração.

Anônimo disse...

Ruy é um dos melhores escritores baiano.